Se você já leu sobre ou praticou mindfulness, também já deve já deve ter ouvido falar sobre as contribuições de mindfulness para a saúde e o bem-estar. Os benefícios de mindfulness têm interessados cada vez mais aos profissionais de saúde, em particular psicólogos e profissionais de saúde mental.
E, como os profissionais da psicologia estão utilizando mindfulness na sua prática clínica, em consultórios, com clientes e pacientes? Essa foi a pergunta que norteou o trabalho de mestrado de Mariana de Azevedo, orientada pela professora Dra. Carolina Baptista Menezes, realizado pela Universidade Federal de Santa Catarina e que contou com a participação de psicólogos em todo o Brasil.
Desde a década de 2010, a população mundial geral têm demonstrado interesse em meditação e mindfulness, principalmente após o lançamento dos Programas Baseados em Mindfulness (MBP). Os MBP são treinamentos de habilidades ou intervenções breves. Os resultados da participação em treinamentos desse tipo indicam benefícios na saúde mental, sendo utilizados como práticas complementares para condições de saúde mental ou promoção do bem-estar e qualidade de vida, não substituindo o tratamento farmacológico tradicional. Hoje, as aplicações de MBP são promissoras e, no Reino Unido, o treinamento de mindfulness chamado MBCT já faz parte das intervenções de referência oferecidas pelo sistema de saúde britânico para a continuidade do tratamento de prevenção de recaída em depressão.
Por aqui, a integração de mindfulness no sistema de saúde (SUS) é algo recente e foi apenas com a instituição da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), em 2006, que surgiu a possibilidade de reconhecer o mindfulness como uma prática em saúde. Contudo, as pesquisas com intervenções baseadas em mindfulness são bastante recentes em solo brasileiro. Há pesquisas realizadas com estudantes e profissionais da área de saúde, mas não com psicólogos em atuação, assim não demonstrando de forma empírica o conhecimento de tais profissionais sobre mindfulness ou dos benefícios possíveis sobre os sintomas de seus pacientes.
No ano de 2016 realizou-se um levantamento sobre as Práticas Integrativas Complementares (PIC) em um centro hospitalar universitário e concluiu-se que apenas 15,8% dos profissionais possuíam capacitação em Práticas Integrativas e Complementares (PIC), mas esses profissionais possuíam a capacidade de informar seus pacientes sobre as PIC, o que indica que há uma relação entre o conhecimento e a capacidade de informar e recomendar tais práticas.
Na pesquisa realizada por Mariana e Carolina, e cujos resultados foram relatados no artigo Conhecimento, Recomendação e Uso de Mindfulness por Psicólogos Clínicos Brasileiros, participaram psicólogos de todas as regiões do Brasil, de diversas abordagens terapêuticas e que possuíam registro ativo em um dos 23 Conselhos Regionais de Psicologia (CRP). Os participantes responderam um questionário que continha 41 perguntas sobre mindfulness, prática pessoal e profissional. No total, foram obtidas respostas de 417 profissionais de todo o país.
Sobre o conhecimento de mindfulness pelos psicólogos clínicos, apenas 5,76% indicaram ter muito ou total conhecimento. A maioria dos psicólogos declarou não possuir nenhum conhecimento. Houve diferença significativa nas categorias de conhecimento para cada grupo de abordagens. Dos psicólogos da abordagem cognitiva, 7,59% declarou possuir muito ou total conhecimento no tema; psicanalítica, 2,59%; e 14,89% dos psicólogos das abordagens informadas em mindfulness declaram seu conhecimento como “muito/total”.
Sobre recomendação de mindfulness para pacientes, 47,96% profissionais recomendaram mindfulness aos seus clientes pelo menos uma vez. Dentre os que recomendaram, 41,5% havia declarado seu conhecimento em mindfulness como inexistente ou pouco. Dos profissionais que nunca haviam recomendado mindfulness a seus clientes, 28,3% declararam que há a possibilidade de recomendação futura.
A respeito do uso profissional de mindfulness pelos psicólogos, 130 (31,18%) profissionais declararam que utilizaram mindfulness na prática clínica com seus clientes pelo menos uma vez. Destes, 122 profissionais responderam sobre a autopercepção da aptidão para ministrar mindfulness. Trinta e seis (29,51%) admitiram que não se consideravam aptos a ministrar mindfulness para seus pacientes.
Quanto à prática pessoal de mindfulness pelos psicoterapeutas, 25,37% declararam praticar. O uso pessoal de mindfulness foi menor nas abordagens psicanalíticas. Metade dos profissionais de abordagens informadas em mindfulness pratica-o pessoalmente, demonstrando que embora não se sintam aptos a aplicar a prática com os clientes, estão cientes de seu benefício.
É importante levarmos em consideração que para esse estudo a participação era voluntária. Portanto é provável que profissionais com maior interesse no assunto sejam os que decidiram participar. Esse dado indica a necessidade de que uma pesquisa de mesmo estilo seja realizada com uma gama mais ampla de profissionais da Psicologia, quem sabe realizada pelo Conselho Profissional.
Ainda assim, o estudo permitiu que se compreendesse que o interesse na prática de mindfulness vem sendo impulsionado pela ampla divulgação midiática de seus benefícios que ocorre de uma maneira mais acelerada do que o profissional pode se qualificar. É comum que a disseminação entre o público geral aconteça de uma maneira muito mais acelerada do que é possível realizar estudos de qualidade que verifiquem a efetividade das práticas ou para que os profissionais possam buscar capacitações para atender à demanda. No caso do mindfulness, tal descompasso pode acarretar na sua utilização de maneira imprecisa mesmo quando feita em ambientes clínicos.
Concluiu-se que o conhecimento produzido sobre mindfulness ainda é escasso no idioma português e que é necessária a promoção de capacitações por meio de diferentes canais para o acesso de profissionais para que uma aplicação eficaz de mindfulness na psicoterapia possa ser avaliada. O estudo também demonstra a necessidade em se compartilhar a responsabilidade pelo debate sobre e inclusão das PIC, incluindo mindfulness, no contexto psicoterapêutico de forma ética, envolvendo as entidades reguladoras e de saúde, centros de formação e pesquisa, o profissional psicólogo e o cliente.
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